terça-feira, 1 de junho de 2010

Apostila de Sociologia



"RETIRANTES" _ Cândido Partinari - i944, pintura, óleo sobre tela, 190 x 180 em. Aeeryo MASP.


Desigualdade na Sociedade

Muitas pessoas acreditam que há oportunidades para todos - que todos têm uma chance aproximadamente igual de ser bem­ sucedidos. É difícil para nós perceber que a desigualdade está embutida na própria natureza da sociedade, que somos todos, na verdade, par­te de estruturas sociais que tolhem a igualdade de oportunidades. A maioria de nós passa boa parte da vida tentando ter sucesso em uma sociedade que, em nossa percepção, é aberta.
Entretanto, sempre tivemos desigualdade na sociedade. Sempre tivemos algumas pessoas, privilegiadas e um grande número de po­bres, herança de classe nas famílias e oportunidades limitadas pela classe em praticamente todos os aspectos da vida: governo, educa­ção, assistência médica, escolha do bairro onde morar, a lei e os tribunais, para mencionar apenas alguns.

Há várias razões por que é difícil para nós perceber isso. Primei­ro, a igualdade de oportunidades tem sido uma parte fundamental da herança que nos ensinaram. Segundo, muitas pessoas vieram para cá de sociedades com muito menos oportunidades, conseguindo ser bem­ sucedidas aqui enquanto não teriam tido a oportunidade de êxito em sua terra natal. Terceiro, devido ao enorme crescimento industrial, a posição de quase todos melhorou com relação à de seus pais. Por fim,a desigualdade é facilmente oculta, em especial nos extremos da pobreza e da riqueza.

TABELA 5.1 Parcela da renda recebida pelas famílias americanas, por
quintos, 2002 - em US$ .

17,916 33,377 53,16284,016

Fonte: U.S. Census Bureau, Current Population Reports.

Sociologia

1. Renda e riqueza são altamente concentradas, e os impostos não

alteraram significativamente essa concentração. .

2. A desigualdade existente hoje pode ser comparada com a existen-

te no passado.· .

3. Embora seja possível mudar a posição de uma pessoa no sistema de desigualdades, no passado a maior parte dessas mudanças ocor­reu quando todos melhoraram graças à oportunidade econômica. A posição relativa não muda facilmente, e, quando há mudança, em geral a posição relativa passa a ser ligeiramente melhor ou pior
que a dos pais do indivíduo. .

4. A partir da década de 1970, o sistema ocupacional tem mudado muito em relação ao que era - menos empregos na indústria, mais no setor de serviços, menos oportunidades em várias profissões -, levando a uma chance de mobilidade ascendente menor elo que a que caracterizara a sociedade desde seu início.Pela pri­meira vez na história dessa sociedade, os filhos vêem-se diante da perspectiva ele aceitar uma posição inferior à que seus pais ocupa­ram na estrutura de classes.

o SIGNIFICADO DE CLASSE SOCIAL

A classe de uma pessoa é mais facilmente entendida como sua posição na estrutura de classes da sociedade. A "posição de classe" depende de critérios econômicos, sendo a renda e a riqueza os dois mais facilmente compreensíveis. Toda estrutura de classes possui muitas posições ou graduações. Não há consenso entre os sociólogos quan­to ao número de classes - alguns dividem toda a população em duas classes, outros distinguem até 12. O ponto onde se traça um limite e se declara "Esta é uma classe!" depende do que se deseja compreender. Por exemplo, Rossides (1989) identifica cinco classes: alta, média-alta, média-baixa, trabalhadora e baixa. Michael Harrington, por sua vez, interessa-se por três:os pobres, os não-ricos e os ricos. Alguns sociólogos estudam as classes segundo os níveis ocupacionais, por exemplo: executivos de empresas, profissionais liberais, geren­tes, trabalhadores de colarinho-branco, operários e trabalhadores não especíalizados.

Independente de como é definida,a classe possui um rico signi­ficado em sociologia. Ela é semelhante a todas as outras posições na organização social. Quanto mais elevada a classe de uma pessoa,por exemplo, mais poder essa pessoa tem. Ser da classe alta significa que se pode influenciar a ordem econômica e política mais regularmente do que os que são de classe inferior ou vivem na pobreza. Quando os recursos econômicos são importantes 'na interação com os outros,quanto mais alta a classe da pessoa, maior a probabilidade de ela conseguir o que deseja. Pesquisas realizadas a partir da década de 1950 têm documentado qual o grau de poder das pessoas que ocu­pam os altos escalões das grandes companhias, desde determinar o· futuro de comunidades inteiras até influenciar a política externa. Do outro lado do espectro, uma coisa que sabemos com respeito aos pobres de todas as sociedades é que eles não têm poder para contro­lar seu destino econômico, dependem de outros para sobreviver e quase não têm influência na condução da ordem econômica e políti­ca.São os que menor probabilidade têm. devotar e maior probabili­ dade de acreditar que seu voto na: verdade não importa.

A classe também traz prestígio - ou a falta deste. Uma posição elevada traz a admissão nos clubes e vizinhanças "certos", a adimira­ção dos outros, o reconhecimento público. Traz a oportunidade de adquirir bens que simbolizam importância (automóveis caros, dia­mantes, roupas de grife, mansões). Uma posição inferior na estrutura de classes suscita o desprezo de muitos, a afronta de alguns e a simpatia de outros. Em geral as pessoas não almejam uma posição de classe inferior na sociedade, com exceção daqüeles raros indivíduos que não se importam com esse tipo de coisa. Em uma sociedade onde a classe é tão importante, a competiçãp pela posição de classe "cria uma disputa pela dignidade, uma luta para vencer outras pes­ soas a flm de ganhar "amor-próprio" (Sennette Cobb, 1972, p. 147-8).
Obviamente, a posição de classe influencia os privilégios que a pessoa tem na vida, ou o que Max Weber denominou "possibilidades de vida" ou oportunidades de vida. A classe influencia as oportunidades educacionais, a expectativa de vida, a saúde; a colocação profis­sional,a satisfaçao conjugal, a nutrição, o nível de privação econômi­ca e a mobilidade ocupacional e geográfica. A classe influencia todos esses aspectos para nossos filhos, bem como a qualidade de vida que teremos depois da aposentadoria. Influencia ainda a possibilidade de a pessoa ser detida por crime e, depois de presa, a possibilidade de lhe negarem fiança, de ir a julgamento; de ser condenada e de receber uma sentença severa.

A posição de classe também encerra expectativas de papel. Ten­demos a desposar quem se encontra aproximadamente na mesma posição de classe que a nossa. A pobreza gera expectativas educacionais inferiores às geradas pela posição em classe superior. De fato as expectativas da família e dos amigos,em grande medida fundamentadas na classe, influenciam a entrada ou nâo na faculdade, para qual faculdade se vai, as matérias em que a pessoa se matrícula e o prosseguimento ou não dos estudos na pós-graduação. Também vinculados à classe estão o modo como se espera que a pessoa atue em meio a outras, o modo como se espera que ela fale, o que se supõe que ela goste de comer e beber, e música que ela aprecia. Weber denominou' estilo de vida essas expectativas associadas à posição de classe. .

A posição de classe também diz ao indivíduo quem ele é. Ela é uma de nossas identidades principais. Os outros nos rotulam segun­ do a classe, pensamos a respeito de nós mesmos com base na classe, e por meio de nossas ações e modo de vestir indicamos aos outros a nossa classe. Assim como todas as nossas identidades, a identidade de classe influencia o modo como atuamos em meio aos outros.

A posição de classe ajuda a determinar nossa perspectiva e as ações originadas dessa perspectiva. Por exemplo, se estamos na clas­se alta, somos mais inclinados a acreditar no sistema político e a ser politicamente ativos. Também é muito maior nossa tendência a ser conservadores em questões econômicas. Demonstramos muito mais interesse em modos de poupar dinheiro do que em como pagar nos­sas contas, e somos bem mais propensos a julgar severamente quem não consegue pagar as suas. A classe influencia o que pensamos sobre os papéis dos sexos, a religião, a educaçãO e as práticas de educação dos filbos. \'- .

A estrutura de classes, portanto, assemelhasse a todas as demais estruturas das quais fazemos parte: compõe-se de posições de status (classes), cada uma das quais influenciando as ações do ator porque determina para este seu poder, prestígio, privilégio, identidade, papel e perspectiva.

SEXO E RAÇA

Na sociedade brasileira - assim como na maioria das outras ­ raça e sexo atuam da mesma forma que a classe. Nascemos menino ou menina, e isso nos situa em uma posição social, com papel, iden­tidade, poder, privilégio, prestígio e perspectiva vinculados. Por mui­to tempo, a posição da mulher na sociedade andou vinculada a um conjunto específico de expectativas. Os homens tinham por certo que as mulheres deviam ser donas de casa e mães (papéis), e as mulheres adotavam isso como suas identidades. Esses fatores, alia­dos a outros, levaram as mulheres a uma posição inferior em relação aos homens, com menos poder na interação cotidiana e na socieda­ de, menos privilégios (nas escolhas educacionais, sexuais e ocupacionais, por exemplo) e menor prestígio (tradicionalmente, o prestígio da mulher vinculava-se ao do marido).
É claro que a maioria de nós já não aceita sem questionar essa estrutura dos
sexos. Tanto homens como mulheres percebem que a diferenciação dos sexos em posições, bem como os papéis e a gra­duação que dela decorrem, constitui, afinal de contas, uma estrutura social, um padrão social que emergiu ao longo de muitos anos. A Biologia não comanda a estrutura social, e portanto, como tudo o mais que é humano, ela permanece a mesma ou muda à medida que as pessoas interagem no decorrer do tempo. Tais padrões, no entan­to, estão imersos na história, sendo difícil alterá-Ios de um dia para o outro. Embora esteja claro que mudou o modo de pensar a respeito das diferenças entre homem e mulher, também está claro que atualmente o sexo da pessoa continua a ser importante em inúmeros as­pectos, das oportunidades ocupacionais e políticas às expectativas de papel e identidade.
Também ocupamos posições na sociedade com base na raça.
Uma estrutura racial sempre caracterizou o Brasil: os que aqui chegaram vindos da Europa subjugaram os nativos, escravizaram os africa­nos e por fim usaram-nos como mão-de-obra barata. Em cada um desses casos, moldou-se uma estrutura social na qual o status dos não-brancos permaneceu inferior. A segregação foi inserida na lei, e a segregação entre as raças foi embutida nos padrões dos bairros. Dessas posições emergiram expectativas de papel, poder, prestígio, privilégios, identidade e perspectiva. Assim como a estrutura dos sexos, a estrutura racial teve um longo tempo para se desenvolver e é muito difícil de ser alterada. Podemos modificar nossas idéias a res­peito do que é justo, porém é muito mais difícil. garantir maiores oportunidades para as minorias raciais. Quando se tenta fazer alguma mudança significativa - como os programas americanos de "ação afirmativa" e de transporte de alunos de bairros pobres a escolas onde poderiam obter melhor educação -;ouvem-se brados indignados e transtornados vindos de muitos setores. Muitos brancos, assim como muitos integrantes das classes mais altas, não gostam da idéia de perder suas posições privilegiadas na sociedade.

ESTRUTURAS DE CLASSE, RAÇA E SEXO SÃO ESTRUTURAS SOCIAIS ESPECIAIS

Classe, raça e sexo, portanto, são estruturas sociais da sociedade, caracterizadas pelos seguintes atributos: .

1. O indivíduo tem seu lugar determinado nas três ao nascer. A posi­ção inicial da pessoa depende da biologia ou dafamília.

2. A posição do indivíduo em todas as três é perpetuada pela família.

Ou seja, a família situa diretamente o indivíduo (por exemplo, de­terminando a 'raça ou concedendo a riqueza), e a família ensina a posição ao indivíduo (por exemplo, como "atuar como homem"

Sociologia

ou como ser "uma mocinha", ou ainda o modo como "gente como
nós, da nossa classe" deve agir). .

3. Aposição do indivíduo nessas estruturas influencia a colocação na maioria das outras. No governo,nas empresas, nas Forças Armadas ou na escola, o que um indivíduo conquista é influenciado pelas posições de classe, raça e sexo.

4. A posição do indivíduo nessas estruturas em geral é fixa. Evidente­mente, não podemos alterar a raça ou o sexo. A posiçao de classe pode ser menos fixa, mas para a grande maioria das pessoas a posição de classe ao nascer tem grande influência: os ricos nor­malmente permanecem ricos, os pobres permanecem pobres, e os que se encontram no meio deslocam-se ligeiramente para cima ou para baixo com relação à posição em que nasceram. A posiçao de classe ao nascer atua como uma força restritiva: ela nao determina onde a pessoa vai parar, mas atua verdadeiramente como uma influência importante.

5. Várias instituições da sociedade cooperam para proteger e perpe­tuar as estruturas da maneira como estas se desenvolveram. Insti­tuições políticas, jurídicas, econômicas, educacionais, religiosas e familiares nos socializam, incentivam e recompensam para que aceitemos os padrões sociais existentes e nosso lugar nos mes­mos. Com freqüência as estruturas nos são apresentadas como sendo justas; virtuosas e naturais; a oposição a elas é condenada como imoral ou antipatriótica e sujeita a punição.
6. Essas estruturas estão imersas em uma longa história. Por isso é difícil desafiá-las e/ou altera-las. Estamos habituados a elas. São menos sujeitas a contestação do que as estruturas criadas em ou­tras formas de organização, como os grupos e organizações formais. É difícil para a maioria de nós enxergar alternativas realistas a elas, pois parecem uma parte integrante do mundo que aceitamos como natural e que jamais questionamos. Mesmo para aqueles dentre nós que desejam eliminá-las ou pelo menos alterá-las.com freqüência é difícil dar sugestões bem fundamentadas sobre o modo de instituir müdanças viáveis.

As expressões estratificação social e sistema de estratificação São comumente aplicadas a estruturas sociais relativamente fixas, como por exemplo classe, raça e sexo. Estratificação, naturalmente,_ é um conceito emprestado da geologia, na qual se refere a disposiçao das rochas em camadas sob a superfície terrestre. Um sistema de estratificação social assemelha-se às camadas de rocha: é imutável. relativamente permanente e cada indivíduo está incrustado. em sua camada. Entretanto acontecem terremotos às vezes - são relativa mente raros, porém fortíssimos -,e os alicerces são abalados. Mu

Desigualdade 'na Sociedade

A ESTRÀTIFICAÇÃO SOCIAL AFETA A COLOCAÇÃO EM OUTRAS ORGANIZACÕES SOCIAIS

A estratificação social evidencia-se na interação diária. Está entremeada em todas as situações concretas de nossa vida, bem como nas organizações a que nos filiamos. Por exemplo, o modo como a posição de uma mulher é definida na sociedade afeta sua posição na família. Se, na sociedade, espera-se que as mulheres sejam donas de casa e mães, e se elas forem excluídas da plena participação no siste­ma ocupacional, podemos esperar que João seja influenciado de modo a tratar Maria, sua esposa, dessa maneira, e a fazer o mesmo com Bete, sua filha. Isso afetará as ações de João em relação a elas, as oportunidades que lhes proporciona e os privilégios que está dispos­to a conceder. Porém, à medida que a sociedade muda, que as mu­lheres ingressam no mercado de trabalho e nele ascendem Maria será incentivada a conquistar mais poder para si mesma em relação a João, os privilégios serão mais negociáveis; e João será influenciado a mudar seu modo de atuar.

Quando os negros passaram a atuar em conjunto nas décadas de 1950 e 1960, conseguiram uma certa mudança em sua posição relati­va na sociedade americana. Suas posições em comunidades, empre­sas, grupos e escolas melhoraram também, Porém, enquanto o siste­ma de estratificação social baseado na raça permanecer intacto ele continuará a influenciar as oportunidades individuais em todas as organizações sociais. .

Classe, raça e sexo afetam a colocação do indivíduo em toda organização social. Um interessante estudo de Rosabeth Kanter (1977) examina o modo como á estratificação por sexo afeta os relaciona­mentos nas organizações formais. Primeiramente, o emprego que a pessoa tem é influenciado por seu sexo, sendo que as mulheres ocu­pam menos cargos de supervisão e gerência e preenchem quase to­dos os cargos de secretária, que têm "status inferior, pouca autono­mia ou oportunidade de crescimento e baixa remuneração generali­zada". As imagens dos homens como racionais, eficientes e objetivos e das mulheres como emotivas, irracionais e solícitas atuaram para excluir e justificar a exclusão das mulheres dos centros de poder e responsabilidade. A gerência foi definida como "masculina", os traba­lhos mais rotineiros de escritório como "femininos". A empresa, por­ tanto, possui posições de status masculinas e femininas, e a es­tratificação por sexo na sociedade transmite-·se à empresa. De fato, Kanter também ressalta que as mulheres frequentemente obtêm a satisfação profissional, as recompensas e o prestígio por intermédio dos homens de quem dependem. Julgam a si mesmas e às outras com base nos homens para quem trabalham e não na habilidade demons­trada ou nas tarefas realizadas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Seguidores